Skip links

Quem bate na traseira de outro veículo está sempre errado?

Hoje a AAPROVEL, sua associação de proteção veicular, traz para o debate uma dúvida de muitos motoristas. O culpado na colisão é sempre o motorista que bate atrás? E para te ajudar nessa questão trouxemos o advogado Gabriel Martins Teixeira Borges, para falar um pouco sobre o que a lei diz em relação a esses casos.

Gabriel Martins é advogado, inscrito na OAB/GO 33.568 e OAB/PE 53.536, é Pós-graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil, Pós-graduado em Direito Médico, Pos-graduando em Direito Tributário. Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Defesa do Associativismo – FAN, com atuação na área docente nas disciplinas de Direito Processual Civil, Teoria Geral do Processo, Direito Administrativo, Direito Civil, Prática Civil e Penal. Gabriel desenvolve estudo acerca de associações sem fins lucrativos, com a realização de cursos, palestras, bem como publicação em meio eletrônico e artigo em revista da área.

E associado (a), não se esqueça, a prevenção é sempre o melhor caminho para um transito mais protegido. E uma forma de evitar dores de cabeça é o amparo a terceiros, uma possibilidade que a sua proteção veicular oferece e que, em casos de colisão ocasionados pelo filiado (a), o veículo do terceiro também é amparado.

Quem bate na traseira de outro veículo está sempre errado?

Gabriel Martins Teixeira Borges

Fui convidado pela AAPROVEL para responder a seguinte pergunta: Quem bate na traseira de outro veículo está sempre errado? O tema em questão faz surgir algumas dúvidas, razão que mostra interessante o esclarecimento e conhecimento de como o tema é tratado pelo Poder Judiciário e doutrina.

A presunção de culpa é daquele que colide na traseira, entretanto, existem algumas ressalvas, que fazem como que essa presunção seja desconsiderada.

A regra de que se extrai a inferência, em princípio, de culpa do motorista que segue atrás comporta exceções, evidentemente: e entre elas a da frenagem repentina, inesperada e imprevisível do veículo à frente (RT 396/113)

Em primeiro momento, destaco alguns artigos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), os quais tratam sobre a distância e atenção do condutor. Vejamos:

Art. 28. O condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito.

Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:

II – o condutor deverá guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as condições climáticas;

Art. 42. Nenhum condutor deverá frear bruscamente seu veículo, salvo por razões de segurança.

Art. 192. Deixar de guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu veículo e os demais, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade, as condições climáticas do local da circulação e do veículo:

Infração – grave;

Penalidade – multa.

Conforme a lei, o condutor deve dirigir com os cuidados indispensáveis à segurança do trânsito e também guardar a distância segura entre o seu veículo e os demais. Além disso, pode dizer que o evento está ligado ao excesso de velocidade daquele que está atrás ou da sua reação tardia quando o veículo a frente realiza uma parada ou diminui a sua velocidade. Nesse sentido, o ilícito no trânsito que gera a colisão está ligado diretamente a falta de atenção e distância, aqui destaca o ensinamento de Wilson Melo da Silva (1983, p.375-377) apud Rui Stocco (2013, p.667):

“o motorista que segue com seu carro atrás de outro veículo, prudentemente, deve manter razoável distância do mesmo, atento à necessidade de ter de parar de um momento para o outro. Ele não vê e não sabe, às vezes, o que se encontra na dianteira do veículo em cujo rastro prossegue. Mandaria, por isso mesmo, a prudência, que tivesse cautela e atenção redobradas para que não se deixasse colher de surpresa por alguma freada possível do veículo após o qual ele desenvolve sua marcha”.

Mas, qual a distância segura? Wladimir Valler (1993, p.270-271) aponta:

“A denominada distância de sergurança se destina a oferecer ao motorista o tempo necessário para a atuação de reflexos e procurar conter a máquina sob a sua responsabilidade(…) Para os motoristas, o tempo médio varia em ¾ de segundo e 1 segundo e ¼. Durante o tempo de reação, ou seja, entre o instante em que o motorista recebe o estimulo (por exemplo: um predestre atravessando a rua distraidamente) e a resposta (por exemplo: frenagem, mudança de direção etc.), o veículo perecorre certa distância que é denominada ‘distância de reação’, a qual muitas vezes deve ser considerada, na análise do acidente, para que possa concluir como realmente ocorreu o evento. Assim, deixando o motorisa de manter a distância segura, a frente não pode constituir circustância excludente de sua culpa”.

Portanto, deve o condutor que segue atrás estar atendo ao trânsito (art.28, CTB) e manter a distância frontal (art. 29, II, CTB), dado que, pode ocorre que o veículo a frente tenha que relaizar por motivos de segurança uma frenagem, cabendo aquele que segue atrás, conter o seu veículo para não colidir na traseira daquele que segue a frente. Rui Stocco transcreve a obra L’iter Dell’incidente Stradale; Milano: Giuffrè, 1951, p. 202:

No talhonamento prolongado a distância em metros deverá ser igual à metade da velocidade (30 km = 48 m; 60 km = 30 m; 100km = 50 m etc.) e em estradas escorregadias: um metro de distância para cada quilômetro de velocidade (50 Km = 50 m; 70 km = 70 m; 100 km = 100 m).

Considerando os cálculos e estudos, você mantém essa distância?

A causa do acidente não é a parada do veículo a frente, salvo os casos de uma frenagem sem motivos de segurança. Nessa linha, diz Rui Stoco in Tratado de Responsabilidade Civil – Doutrina e Jurisprudência que “a causa eficiente de eventual colisão daquele que trafega logo atrás não é propriamente essa frenagem, mas a pouca ou nenhuma distância guardada pelo condutor do veículo que o antecede ou, até mesmo, a sua desatenção”.

Como colocado acima, o motorista deve ter o tempo de reação, quando está muito perto, isso acaba impossibilitando a parada sem a colisção a frente.

Um fator que influência nessa distância e tempo de reação é o aparelho celular, ora, quando o contudor está com o celular na mão, falando ou digitando (pior ainda), sua atenção ao trânsito é deslocada para o aparelho, diminindo os seus reflexos, assim, se alguém a frente fizer uma frenagem em virtude de um engarrafamento, o condutor desatendo, provavalmente irá colidir em sua traseira.

Veja que a causa principal é a distância e não a ação do veículo que segue a frente que tenha que realizar uma frenagem, para exemplificar, veja alguns julgados do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás:

“APELACAO CIVEL EM PROCEDIMENTO SUMARIO. ACAO DE REPARACAO DE DANOS POR ACIDENTE DE TRANSITO. COLISAO PELA TRASEIRA. I – O CONDUTOR DO VEICULO QUE ABALROA OUTRO QUE SEGUE A SUA FRENTE, POR NAO GUARDAR A DISTANCIA REGULAMENTAR, DE MODO A IMPEDIR A COLISAO, TORNA-SE RESPONSAVEL PELOS DANOS CAUSADOS NO ACIDENTE. II – A FRENAGEM BRUSCA DE VEICULO QUE VAI A FRENTE NÃO EXIME O MOTORISTA QUE O SEGUE, POIS O ACIDENTE NESTA CIRCUNSTANCIA, DECORRE PRINCIPALMENTE DO DESCUIDO DE MANTER A DISTANCIA DE SEGURANCA IMPOSSIBILITANDO UMA REACAO PREVENTIVA E DA VELOCIDADE DESENVOLVIDA PELO AGENTE, TRADUZINDO A RESPONSABILIDADE DO AGENTE PELOS DANOS CAUSADOS.”(TJGO, APELACAO CIVEL EM PROCEDIMENTO SUMARIO 109763-1/190, Rel. DR(A). AMARAL WILSON DE OLIVEIRA, 1A CAMARA CIVEL, julgado em 22/07/2008, DJe 158 de 21/08/2008).

“APELACAO CIVEL. ACAO REPARACAO DE DANOS C.C. LUCROS CESSANTES. ACIDENTE DE VEICULO. COLISAO PELA TRASEIRA. CULPA DO MOTORISTA DO VEICULO QUE SEGUE ATRAS. A FRENAGEM BRUSCA DE VEICULO QUE VAI A FRENTE NAO EXIME O MOTORISTA QUE O SEGUE, POIS O ACIDENTE, NESTA CIRCUNSTANCIA, DECORRE PRINCIPALMENTE DO DESCUIDO EM MANTER A DISTANCIA DE SEGURANCA IMPOSSIBILITANDO UMA REACAO PREVENTIVA E DA VELOCIDADE DESENVOLVIDA PELO AGENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.”(TJGO, APELACAO CIVEL 62247-2/188, Rel. DES. JOAO WALDECK FELIX DE SOUSA, 3A CAMARA CIVEL, julgado em 03/09/2002, DJe 13871 de 25/09/2002).

Entretanto, como dito, a presunção de de culpa daquele que colide na traseira é relativa e não absoluta, devendo, no caso concreto, analisar a origem do evento:

Acidente de trânsito. Colisão em rodovia. Culpa de quem colide por trás. Presunção relativa. Possibilidade de prova em contrário. Em colisão de veículos é relativa a presunção de que é culpado o motorista cujo o carro atinge o outro por trás”. (RT, 575/168). “Colisão na traseira. Presunção de culpa em relação ao motorista que bate com o seu veículo na traseira de outro. Tal presunção não é absoluta; cede ante provas precisas no sentido da responsabilidade do atingido”. (RJTJSP, 59/107)

Destarte, pode haver a caracterização de culpa, mesmo sendo colisão traseira, daquele que realiza uma frenagem que não seja por motivos de segurança, como exemplo o motorista que para no sinal verde por desatenção ou aquele que para em uma rodovia sem acostamento atender um celular.

Portanto, caberá ao condutor que colidiu na traseira provar que o evento ocorreu por uma ação do condutor a frente. Nesse caso, pode ser considerada uma culpa exclusiva daquele que estava a frente ou culpa concorrente, aquela em que ambos as partes concorrem para o acidente.

Exemplificando, veja o julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

DUPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS POR ACIDENTE DE TRÂNSITO C/C FIXAÇÃO DE PENSÃO. ABALROAMENTO EM TRASEIRA DE OUTRO VEÍCULO. PRESUNÇÃO CULPA. RELATIVA. MORTE DO ESPOSO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. CULPA CONCORRENTE. REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO PROPORCIONAL. 1. O ordenamento jurídico pátrio adota, como regra geral, a teoria da responsabilidade civil subjetiva, que tem como fundamento a conduta dolosa ou culposa do agente, a teor do disposto no art. 186, do Código Civil. Assim, comprovado o nexo causal e o dano, bem como a inexistência de qualquer excludente de responsabilidade, resta caracterizada a responsabilidade civil e, de consequência, o dever de indenizar do apelante. 2. A presunção de culpa em relação ao motorista que bate com o seu veículo na traseira de outro não é absoluta e cede frente a provas no sentido da responsabilidade do atingido. 3.  Corroborando a conclusão pericial com as demais provas dos autos e as informações prestadas pelas testemunhas, conclui-se que o veículo da empresa ingressou na rodovia sem os cuidados devidos, enquanto o veículo das vítimas se aproximava e apresentava as faixas refletivas, adesivadas na traseira, desgastadas, quando houve a colisão. 4. Por sua vez, a vítima não adotou os devidos cuidados ao trafegar naquele trecho da GO-438, à noite, tendo um semirreboque carregado atrelado à sua traseira que não possuía sistema de freios, o que contribuiu na redução da eficiência do sistema de frenagem para apenas 50% de sua capacidade. Assim, embora estivesse trafegando a uma velocidade permitida para a via, naquele trecho não era condizente com as condições do lugar, do tempo e do próprio veículo. Diga-se ainda que o local era sinalizado com placas de sinalização vertical, posicionadas no lado direito da via, alertando sobre a saída de caminhões canavieiros a 300 e a 100 metros do local do acidente. 5. Vislumbra-se, pois, a culpa concorrente das partes pelos danos sofridos na colisão dos veículos, visto que a conduta de ambos contribuiu para a ocorrência do resultado. 6. Na culpa concorrente, sabe-se que o valor a ser definido a título de indenização deve corresponder à proporção da contribuição de cada um para o evento (artigo 945 do Código Civil), o que no caso concreto equivale a 50% (cinquenta por cento) para cada um.  APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDAS E DESPROVIDAS. (TJGO, Apelação (CPC) 0035773-16.2012.8.09.0049, Rel. NELMA BRANCO FERREIRA PERILO, 4ª Câmara Cível, julgado em 09/04/2019, DJe  de 09/04/2019)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS COLISÃO EM VIRTUDE DE INVASÃO DA PISTA CONTRÁRIA. FRENAGEM. COLISÃO TRASEIRA. CULPA CONCORRENTE EVIDENCIADA. RECURSO ADESIVO. PREPARO INSUFICIENTE AUSÊNCIA DE COMPLEMENTAÇÃO DAS CUSTAS. DESERÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. I – atua com inegável culpa aquele que, conduzindo caminhão, ingressa na faixa de direção inversa, obrigando quem nela trafegava a frear abruptamente, ocasionando a colisão traseira daquela que trafegava logo atrás. II – portando-se o condutor de veículo de forma negligente e imprudente ao invadir a pista contrária, vindo a ocasionar a colisão de veículos que trafegavam naquela mão de direção, resta caracterizado sua culpa pelo evento danoso, devendo reparar o dano comprovado. III- o fato do veículo do réu ter perdido o controle e invadindo a pista contrária em razão de ocorrência de chuva, não configura caso fortuito, pois o motorista, ao conduzir veículo em situações de risco, deve agir com redobrado cuidado de forma a evitar derrapagens. IV – o motorista que segue atrás deve manter atenção e uma distância segura do automóvel a frente que lhe permita, em situação de emergência, evitar uma colisão. inobservadas essas cautelas, deve-se reconhecer a culpa concorrente do motorista pelo abalroamento na parte traseira do carro que o precedia. v – a redação do artigo 511 do cpc e taxativa ao dispor que no ato de interposição do recurso o recorrente comprovará o respectivo preparo, sob pena de deserção. uma vez intimada a parte para complementar as custas recursais, e não o fazendo, impõe-se o não conhecimento do recurso. apelação conhecida e desprovida. recurso não conhecido. (TJGO, APELACAO CIVEL 37088-96.2011.8.09.0087, Rel. Dr(a). Marcus da Costa Ferreira, 1a camara civel, julgado em 04/09/2012, dje 1148 de 19/09/2012).

 

Por fim, sobre a pergunta: Quem bate na traseira de outro veículo está sempre errado? Como entendido, a presunção de culpa é daquele que colide na traseira, dado a falta de atenção ou distância de segurança, porém, a presunção não é absoluta, cabendo demonstrar no caso concreto a origem do acidente, provado que ocorreu uma situação fora da normalidade ou uma frenagem por um motivo que não era de segurança, poderá ficar demonstrada a culpa do veículo da frente ou, em outra situação, provar que ambos os condutores agiram com culpa.

 


Referências:

Almeida, Lino Leite de. Manual de perícias em acidente de trânsito. 2 ed. Campinas: Millennium Editora, 2014.

Arnaldo Rizzardo. A reparação nos acidentes de trânsito.12 Ed. RT,2013.

Brasil, Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503Compilado.htm. Acesso em 27/08/2020.

Macedo, Leandro. Curso de Legislação de Trânsito. 6 ed.rev. Salvador: Editora JusPodvim, 2019.

Silva, Wilson Melo da. Da responsabilidade civil automobilística. 4.Ed. São Paulo. Saraiva, 1983.

Stoco, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência, tomo II. 9. Ed. ver., atual. e reformulada com Comentários ao Código Civil. São Paulo: RT, 2013.

Valler, Wladimir. Responsabilidade civil e criminal nos acidentes automibilisticos. 2.ed. Campinas. Julex Livros, 1993.

 


Quer saber mais sobre o amparo, proteção veicular, benefícios, ações sociais e novidades da AAPROVEL? Acesse a aba de vantagens do nosso site e nos acompanhe nas redes sociais @aaprovel. E se ainda ficar com dúvidas, venha até nossa sede tomar um cafezinho com a gente, é que tem tanta coisa boa pra contar que não cabe apenas em um texto.

Leave a comment

Name

Website

Comment